Em O samba do crioulo doido, Luiz de Abreu usa a dança para desconstruir identidades raciais. Ao fazer Calixto Neto reproduzir os estereótipos vinculados à representação do corpo negro, profundamente ancorado no Brasil, pego entre o exotismo e erotismo, o coreógrafo vira o clichê contra si mesmo para zombar da consciência racista. Nesse solo radical, ele emprega uma linguagem coreográfica singular, através da qual reorienta a questão da identidade na própria materialidade do corpo. A violência de seus escritos parece proporcional à urgência de enfrentar a questão decolonial, o legado da escravidão e as relações de dominação contemporânea. Conduzida por um humor transgressivo, a peça forma uma crítica direta à condição subordinada à qual os negros são designados. Em gestos de desvio da bandeira nacional, trata-se aqui de dançar o desenvolvimento de uma liberação física com efeitos emancipatórios, um grito pelo qual a passagem do corpo-objeto para o corpo-sujeito é organizada. Nesta nova versão do solo, Luiz de Abreu e Calixto Neto trabalharam na construção de uma linguagem de transmissão. Eles desenvolveram, através da oralidade, procedimentos metodológicos para a transmissão e produção de conhecimento de um corpo negro para outro corpo negro.
Ao final da apresentação, um curta-metragem de Calixto Neto durante os ensaios da peça será exibido. ????: Gil Grossi