RODA VIVA (Cobertos pelo Céu – Coleções em Viagem)

Gustavo Ciríaco

Através das palavras nomeamos e interpretamos situações, através delas o desconhecido torna-se tangível, o inefável torna-se imaginável. O que pode acontecer no encontro entre as palavras, as ações que delas decorrem e o mundo que corre? Como a partir da materialidade das coisas, podemos afetar nossas ações e gerar um manifesto, uma transformação, um discurso? Pode uma palavra ou pode uma ação sozinha mover um momento, um contexto, guiar uma coletividade?

Obra-manifesto célebre do pintor espanhol Pablo Picasso, Guernica marcou a história ao ilustrar o destino trágico desta localidade espanhola destruída como pelo próprio governo central espanhol para aniquilar a sua oposição. Com figuras e situações que se tornaram símbolos da guerra, Guernica tornou-se um libelo importante contra a injustiça e a guerra. Suas figuras até hoje repetem-se em guerras e confrontos – uma mãe que segura o filho morto, o grito de pessoas em agonia, o desespero dos animais, a casa em chamas. Em um momento em que o mundo parece repetir em diversas formas o vivido em Guernica, faz-se mais ainda pertinente a discussão e reflexão ética das bases que nos unem neste mundo em precipício.

Como nos posicionamos neste estado de coisas? Como convidarmos as pessoas a tomarem consciência ativa das questões prementes do momento através de um dispositivo performativo que confronta nomeação e representação? Entre o testemunho e a exposição, o escrutínio e o espetáculo, o voyeurismo e o acontecimento, que palavras, que verbos, nos orientam, constroem e aproximam?

RODA VIVA traz de volta para o espaço público confrontos e manifestações que marcaram a história local e mundial nos últimos 60 anos. A partir de reformulação e atualização desses eventos em quadros vivos interativos, a peça convida o público a experienciar uma série de imagens históricas que se tornaram icónicas, como a própria Guernica de Picasso, as manifestações da constituinte no Chile, o movimento das Diretas Já, a insurgência do Black Lives Matter, ou mais recentemente os conflitos armados em Gaza, Ucrânia e Moçambique. No Rio de Janeiro, a peça saiu da sala do teatro, onde estreou, para ganhar caráter site-specific adaptado ao espaço da galeria, ativado pelos espectadores.